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(In,em)sanidade Categorias:
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Ontem, estava tentando mexer no meu pequeno jardim. Inspirado por um amigo,  que ama a natureza, resolvi tentar a vida de “jardineiro” para ver se realmente funciona no manter a sanidade.

Pois bem, sou um iniciante ainda, mas aprendi a identificar bem rápido alguns tipos de “intrusos” que podem ser muito nocivos às minhas plantas. Foi fácil, bastou olhar para saber que aquilo ali não pertencia aquele projeto que eu tinha.

Mas, o que me intrigou é que, nas últimas 2 semanas, enquanto catava o que não prestava no jardim e com cuidado cirúrgico removia até a raiz, percebi que algo diferente crescia, mas, meus olhos não treinados ficaram em dúvida da malignidade daquele arbustinho, até bonitinho.

Precisei de ajuda, e coragem para arrancá-lo e todo meu conhecimento de longos 1 mês de jardinagem, até me deram “autoridade” para questionar quem me dizia que aquilo era um arbusto. Assim que terminei de arrancá-lo, meio a contragosto, veio à minha mente, Jo. 15, e Hb. 12. Ele é o agricultor, Ele vai podar, Ele vai arrancar, para o meu bem.

Tenho me questionado muito nesses últimos dias, visto, ouvido e principalmente acompanhado a história de muita gente, plantada na vinha do Senhor, que, após alguns (ou muitos) anos de estrada (jardim), encontram-se desgastados, estagnados, perdidos, inconformados e, de certa forma, amargurados.

Quando entendi de Deus meu chamado missionário, fui impactado pela vida e pelo brilho no olhar que vi nos “jocumeiros” que me cercaram. Foi o Beto Tavares numa varanda, compartilhando o amor ao Senhor em forma de poesia, o cumpadre Lauré numa rodoviária, mostrando-me com uma paixão e simplicidade as fotos de sua estada na África, ou o olhar visionário, amoroso e perseverante do Tio Wellington, que me incluiu e agradeceu por ser o único junto com minha noiva a estarem fazendo evangelismo em um rodeio. Nós nos encontramos por uma “Jesuscidência”, mas, esses e muitos outros, mudaram o rumo daquilo que eu pensava ser sano e correto para o meu viver.

Onde as coisas se perdem? Ou melhor, onde deixamos de lado a sanidade do viver simples do Evangelho e da vida missionária e nos envolvemos tanto em outras coisas que, essa própria sanidade, torna-se insana?

Ao arrancar cada matinho, eu pensei como seria se aquele arbusto tivesse a chance de se esquivar, de não se deixar podar. Creio que esse é o ponto. Em determinados momentos, fixo tanto no que se torna certo aos meus olhos, que nem minhas orações conseguem ser francas. O dia a dia missionário, a intercessão, a fila do almoço e a comunidade se tornam enfadonhas.

Passo a não ver por trás das atividades e, principalmente, substituo todo o meu comportamento, ou caráter, pelas minhas habilidades. Esqueço, e faço questão de esquecer, que, às vezes, outros vão me ajudar a ver as ervas daninhas camufladas e, insanamente, deixo-me levar pela certeza de que a experiência que adquiri vai me suster.

A grande verdade, creio eu, é que o ciclo da poda não é agradável, mas é necessário. Se não houver, em breve, só apresentarei folhas. Nenhum fruto, nem uma florzinha, apenas folhas e galhos, e alguns tão finos e bem colocados, que passam no canto do olho de qualquer visitante que tente chegar ao pondo de poda.

A única coisa que consegui pensar foi que, se não me deixar podar, não me submeter, não me renovar a cada manhã no Senhor, vou terminar meus dias, olhando para trás, cobrando meus direitos, tentando usar uma “imunidade” eclesiástica para me justificar, pedir contagem de tempo na casa e não frutificar mais.

Vou com certeza viver uma vida, improdutiva, intragável, infrutuosa e insana. Não quero chegar ao final de tudo, cantando como Belchior (cadê ele?):

“Já faz tempo eu vi você na rua, cabelo ao vento gente jovem reunida
Na parede da memória, esta lembrança é o quadro que dói mais
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”

Quando vim para o campo missionário, toda perspectiva familiar girava em torno da aposentadoria sofrida, de quase 1 salário mínimo por mês, e de como era injusto trabalhar tanto por tão pouco reconhecimento.

Eu decidi naquele jardim, aceitar as podas, por mais dolorosas que sejam, pois, elas vão me deixar frutífero em qualquer estação da vida, mesmo naquela em que a única coisa que vai dar para extrair é a lembrança da sombra que um dia minha árvore fez.

Como diz o poeta, ou seria o profeta?!

“Saí da sombra da morte,
Peço licença, já vou
Vou desfrutar liberdade
Meu cativeiro acabou”.

Edição e Revisão: Saulo Xavier.